domingo, 18 de agosto de 2013

Victory 8B, um naufrágio a minha espera

Caros amigos,

Hoje o post é para falar sobre uma experiência que apesar de negativa me ensinou muitas lições. Trata-se de minhas tentativas de mergulhar e conhecer o naufrágio Victory 8B nas águas da Guarapari, Espírito Santo. Isso mesmo, tentativa, pois eu abortei em todos os mergulhos, e não tenho vergonha alguma em assumir ter feito isso. Vocês podem perguntar, mas como o Luis fez isso? Jogou dinheiro fora? Ficou com medo? Nestas horas, o melhor é pensar em você e sua vida. Uma série de variáveis influenciaram este "insucesso". Mas vamos aos meus relatos dos dias 31 de maio e 01 de junho de 2013.

Bem, eu estava com a adrenalina muito alta por estes mergulhos, pois nos dias anteriores pesquisei sobre o naufrágio na internet, vi alguns vídeos no youtube e um deles você pode ver ao final do post. Creio que este excesso de adrenalina ajudaram a me derrubar.

Todas as operações foram feitas pela Atlantes Guarapari, e com os meus amigos da Cesar Dive Team.

Nosso primeiro mergulho ocorreu na Ilha Escalvada. O objetivo desta descida era apenas para nos ambientarmos com nossos equipamentos, pois o Cesar Gentile estava com seu Rebreather, o Edimar Barbosa e o Marcelo Gonçalves de Side Mount, eu e o Marcos Cetrone com um cilindro stage S80. A água estava com 22 graus de temperatura e visibilidade de 8 metros. Por eu estar há algum tempo sem treinar, pois o último mergulho havia ocorrido no dia 21 de abril, meu consumo de gás foi alto, iniciei meu cilindro com 174 bar e terminei com 116 bar com apenas 13 minutos e profundidade máxima de 15 metros. O que me espantou foi que estávamos com Nitrox EAN30. Vimos algumas espécies em todo esse tempo. Julguei como um fato positivo ter aprendido mais alguns truques de regulagem de meu computador Oceanic VT 4.0, mas depois de conversar com o Cesar e o Edimar percebi que havia errado uma série de configurações. Errando é que a gente aprende.

O segundo mergulho foi o tão esperado Victory. A temperatura da água estava em 22 graus, visibilidade de 8 metros e com correnteza. Meu cilindro principal iniciou em 101 bar e terminou em incríveis 1 bar, isso mesmo, e aqui já vale a primeira advertência, nunca deixe seu cilindro chegar a esta quantidade de gás, mas é importante ressaltar, eu só permiti chegar neste nível de gás porque eu estava com outro cilindro stage. Após um intervalo de superfície de 2 horas e 25 minutos o meu mergulho durou 14 minutos e cheguei a uma profundidade de 32 metros.

Dados técnicos concluídos, vamos ao relato de tudo o que me ocorreu neste mergulho. O trajeto do barco, onde caimos na água até chegar a bóia e descer até o naufrágio já foi mais uma variável que me influenciou em abortá-lo, pois nadamos bastante, a correnteza era grande, a preocupação em chegar ao ponto certo e ter que descer rápido, era tudo muito estressante. Com o alto consumo de gás no primeiro mergulho, fiquei preocupado monitorando constantemente no computador e num curto espaço de tempo meu equipamento apitada constantemente me avisando, e fiquei sem entender esses avisos. Ao chegar aos 32 metros eis que a minha querida amiga narcose me atacou e no meu caso eu sinto fobia, começo a salivar bastante e logo me engasgo. O bocal do 2o estágio que eu estava usando no cilindro stage era menor e a pressão de emissão do gás imensamente menor do que o meu principal, logo, me veio o episódio da Laje de Santos na cabeça. Bem, mas antes de tudo isso ocorrer, quando meu computador apitava fui até o Cesar Gentile para sinalizar o que estava ocorrendo. Ele a partir disso me colocou ao seu lado para me monitorar e me ajudou a eu me acalmar. Conseguimos navegar um pouco, cheguei a ver alguns cardumes e partes do naufrágio. Fiquei encantado com sua arquitetura, mas eis que chegou o momento de eu trocar e passar a usar o stage. E então, quando fiz a troca de gás eu engoli água, o 2o estágio saiu da minha boca e na volta engoli água. O Cesar chegou a purgar o regulador para cortar a minha sensação de engasgo e eu mordi com toda a força que tinha o bocal para que ele não escapasse novamente. Eis que o Cesar então começou a me levar de volta para a superfície e tentando me acalmar durante o trajeto. Era uma sensação horrível, apavorante, pois eu puxava todo o ar e ele não vinha, eu senti um medo enorme de que fosse dessa pra melhor naquela hora. Muitas coisas vieram na minha cabeça, em especial minha esposa e minha família, não podia morrer naquela hora e abandoná-los. Cesar tentava me levar devagar para não sofrer nenhum episódio de DD (Doença Descompressiva). Ao voltar para a superfície eu agradeci e pedi desculpas imensamente ao Cesar Gentile, pois tive a sensação de estar estragando a diversão dele e dos meus amigos. Fiquei por um tempinho na superfície e então a embarcação da Atlantes me resgatou de volta.

Logo depois do ocorrido, a minha sensação no barco durante a volta era horrível. Além do enjôo, muito natural, me sentia um derrotado novamente. Não estava me perdoando por isso. Quando retornou, o Cesar logo me chamou para conversar e avaliar o que havia acontecido comigo e para saber como eu estava me sentindo. Eis mais um ponto que aprendi com o episódio, um bom instrutor não é somente aquele cara que lhe transmite técnicas, teorias, mas quem pode avaliar sua performance e suas condições psicológicas e te leva a refletir sobre estes aspectos. Este é mais um dos episódios em que posso assegurar para vocês leitores deste blog, a escolha do instrutor é um fator fundamental para o seu aprendizado, e eu posso garantir que fiz não uma opção por alguém que me transmitiria conhecimentos, mas por ganhar mais um grande amigo. Já tive relatos e presenciei um fato onde aconteça o que acontecer, o Cesar Gentile é um cara que não te abandonará, se necessário ele se ferra junto contigo para tentar salvar a sua vida.

No dia seguinte partimos novamente para o Victory, desta vez com outro planejamento para penetrar o naufrágio. Optamos por não mergulhar na Ilha Descalvada para termos os dois cilindros cheios. Além disso, eu optei por usar primeiro o cilindro stage com o 2o estágio com bocal menor, na quel estou menos acostumado e depois usaria o meu equipamento normalmente. O stage estava com EAN27 e o outro cilindro com EAN30. Neste dia a temperatura da água estava em 23 graus, visibilidade da água era de 8 metros e sem correnteza. Cai em mais uma pegadinha da autosuficiência, pois antes de cairmos para água, a tripulação tinha um respeito e admiração enorme pelo nosso grupo, pois eramos a única turma de mergulhadores técnicos, e aquilo me fez sentir poderoso. Ledo engano. Me esqueci da frase que mais admiro do Sócrates, o filósofo, "só sei que nada sei, porque nada sabei".

Caimos na água e nadamos bastante até a bóia onde o cabo guia estava amarrado. Desta vez o esforço físico foi maior pois não havia correnteza. Por isso, demorei e não consegui num curto espaço de tempo controlar a minha respiração. Ao descer o 2o estágio do stage saiu da minha boca e novamente engoli água, isso porque eu estava numa profundidade de 5 metros apenas. Foi aí que veio todo o episódio do dia anterior e decidi abortar. Sinalizei ao Edimar que estava descendo na sequência. Sinalizei ao barco da Atlantes quando eu estava na superfície e retornei para a embarcação. Logo imaginem como eu estava descepcionado comigo mesmo.

Bem meus amigos, num próximo post escreverei sobre algumas reflexões que tive sobre saber a hora de abortar um mergulho. O importante é que todo este episódio me trouxe muitos aprendizados que carrego inclusive para a minha vida profissional, e que depois num dos melhores mergulhos que fiz na vida, o Shark Dive em St Maarten, foi importante eu ter vivido, mas isso é assunto para outros posts.

Enfim, ficam aqui belas lições e antes mesmo que eu espere retornarei ao Victory 8B para desta vez penetrar e conhece suas instalações.

Até a próxima!!!


Vídeo sobre todo o processo de afundamento do Victory 8B

Mapa da embarcação

Victory antes de afundar

Durante o afundamento



Vídeo produzido pelo Marcos Cetrone durante a expedição ao Victory 8B

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